sábado, janeiro 31, 2009

Cahiers Du Cinéma Portugais (V)

Que imprudente ideia, a do príncipe, ter interrompido Branca de Neve no melhor dos sonos e, com um beijo que ela negará sempre, retirá-la do caixão de vidro para a restituir à vida, isto é, à carne, e arrogar-se direitos sobre ela. Se Branca de Neve deseja morrer ou regressar ao país dos seus anões, é porque não está convencida da boa-fé da rainha. A sua madrasta não quis envenená-la? Quando Branca de Neve, salva pelo príncipe, voltou à vida, a rainha, graças aos seus beijos, não incitou, acto contínuo, o caçador a apunhalá-la? Baseado na obra «Schneewittchen» do escritor suisso Robert Walser, João César Monteiro assina este «Branca de Neve» em 2000, três anos antes de «Vai e Vem», a derradeira obra de um dos mais conceituados cineastas portugueses. Apesar desta obra ter gerado uma grande polémica em Portugal devido à quase inexistência de imagens, este filme foi muito bem recebido pelos críticos de todo o Mundo (mais uma vez, a excepção foi Portugal).

«É preciso morrer para aprender a viver, e o filme experimenta com graça esse outro-mundo. Em todo o caso, para evocar Walser, Monteiro, passa pela obra.» - Jean-Marc Lalanne; "Libération".

«Arrisquemos hipóteses. A provocação dadaísta, a imprecação epistolar, a estalada no gosto do público. A proximidade espiritual do cineasta e do escritor, sob o signo do humor melancólico, da tentação epicurista, da impossível procura pela beleza, e da loucura que ronda. O texto walseriano é admiravelmente dito em português.» - Jacques Mandelbaum; "Le Monde".

«Filme afrontosamente teórico e consagrado à perda da luz ou às incestuosas relações imagem/som, «Branca de Neve» é sobretudo um grande filme sensual, onde a ressurreição da heroína do conto as suas hesitações entre desaparecimento doloroso e esperança de retorno, perdão e ressentimento, não são tratados senão através da matéria fílmica.» - Frédéric Bonnaud; "Les Inrockuptibles".

«Uma obra prima de síntese e de provocação às últimas consequências. Assina-a, não por acaso, um génio do cinema contemporâneo como João César Monteiro. Há no trabalho de Monteiro muito do que é hoje em dia reflexão sobre o corpo cinema. Este filme é uma magnífica lição de cinema.» - Cristina Piccino; "Il Manifesto".



"Mais do que ver, gostaria de ouvir" - Robert Walser


Vídeo e imagem: Madragoa Filmes
Post já publicado no blog "O Bar do Ossian"

9 comentários:

mdsol disse...

:))

Anónimo disse...

genial!

DarkViolet disse...

A maioria dos Ser Humano necessita de imagens para estar alimentado. Não consegue estar somente com o som porque a visão fica cega... A arte da criação quase sempre mal entendida

Frankie disse...

Tenho que confessar que, n'O Bar, este post escapou-me completamente mas, depois de ler este preâmbulo, fiquei com imensa vontade de ver o filme ou, -perdoe-me- de ler o livro.

(Isto do "ler" é uma paranóia minha mas a verdade é que sempre gostei mais de "criar" as imagens a partir das palavras, do que vê-las já prontas na tela)

Anónimo disse...

.
este filme numa sala escura de cinema foi uma experiência absolutamente inesperada pelo efeito que teve em mim.
.

SAM disse...

Adorei o o que li e a reflexão a partir...Desconhecia. Obrigada pela partilha!



Beijos!

Mr. Lynch disse...

Mdsol;
:D





Ca:mila;
"Génio"; uma excelente designação para João César Monteiro.





DarkViolet;
Associo muito vezes este filme ao também excelente "Blue" do Derek Jarman e compreendo quando dizes que a maioria dos seres humanos necessitam de imagens para se sentirem alimentados. Porém, apenas com o som, podemos ser transportados para largos universos...





Frankie;
Acho excelente que leia o livro. Também gosto de ler os livros antes de ver os filmes. Ainda está bem presente na minha memória, a verdadeira "maratona" que efectuei ao ler o livro «Ensaio Sobre a Cegueira» do Saramago antes de ir ver o filme. Terminei esse livro umas 2 horas antes de ir ver o filme! Mas este «Branca de Neve» é diferente... pois mais de 90% do filme está a negro. Basta ouvir o diálogo e a nossa imaginação é o limite.





Corpo Visível;
Saí da sala de cinema impelido a «rever» esta obra.





SAM;
Uma obra obrigatória do João César Monteiro.

film-m k disse...

:)

o sr. césar, tb. chamado pelos franceses como o marquês de sade português, esteve muito bem com este filme, mas (desculpa-me o veneno) esteve ainda melhor quando disse:

"o público que se foda!"

*

Mr. Lynch disse...

Film-m k;
Ou quando lhe perguntaram: «porque fez o filme assim?» e ele respondeu: «porque não pude fazer assado. Queriam o quê? Telenovela, era?»...

http://www.youtube.com/watch?v=_hKtF-jh_Ng