sábado, dezembro 19, 2009

Páginas Soltas

"O leitor leu bem, o senhor ordenou a abraão que lhe sacrificasse o próprio filho, com a maior simplicidade o fez, como quem pede um copo de água quando tem sede, o que significa que era costume seu, e muito arraigado. O lógico, o natural, o simplesmente humano seria que abraão tivesse mandado o senhor à merda, mas não foi assim. Na manhã seguinte, o desnaturado pai levantou-se cedo para pôr os arreios ao burro, preparou a lenha para o fogo do sacrifício e pôs-se a caminho para o local que o senhor lhe indicara, levando consigo dois criados e o seu filho isaac. No terceiro dia da viagem, abraão viu ao longe o lugar referido. Disse então aos criados, Fiquem aqui com o burro que eu vou lá adiante com o menino, para adorarmos o senhor e depois voltamos para junto de vocês. Quer dizer, além de tão filho da puta como o senhor, abraão era um refinado mentiroso, pronto a enganar qualquer um com a sua língua bífida, que, neste caso, segundo o dicionário privado do narrador desta história, significa traiçoeira, pérfida, aleivosa, desleal e outras lindezas semelhantes.»

Imagem:"Abraão e Isaac" de Rembrandt van Rijn
Texto: Excerto de "Cain" de José Saramago

2 comentários:

Sensualidades disse...

tanta confusao para algo tao banal

jokas
Paula

SAM disse...

E ainda hoje, infelizmente, há quem confunda o deus do Temor com o Deus do Amor. E assim foram educadas várias gerações no seio familiar: com temor e sem amor. Esta é mais uma das histórias assombrosas do AT.


Boas festas, o bom e o belo para você e um 2010 feliz e próspero, com sinceridade, amigo! Beijos e meu carinho.