Que imprudente ideia, a do príncipe, ter interrompido Branca de Neve no melhor dos sonos e, com um beijo que ela negará sempre, retirá-la do caixão de vidro para a restituir à vida, isto é, à carne, e arrogar-se direitos sobre ela. Se Branca de Neve deseja morrer ou regressar ao país dos seus anões, é porque não está convencida da boa-fé da rainha. A sua madrasta não quis envenená-la? Quando Branca de Neve, salva pelo príncipe, voltou à vida, a rainha, graças aos seus beijos, não incitou, acto contínuo, o caçador a apunhalá-la? Baseado na obra «Schneewittchen» do escritor suisso Robert Walser, João César Monteiro assina este «Branca de Neve» em 2000, três anos antes de «Vai e Vem», a derradeira obra de um dos mais conceituados cineastas portugueses. Apesar desta obra ter gerado uma grande polémica em Portugal devido à quase inexistência de imagens, este filme foi muito bem recebido pelos críticos de todo o Mundo (mais uma vez, a excepção foi Portugal).
«É preciso morrer para aprender a viver, e o filme experimenta com graça esse outro-mundo. Em todo o caso, para evocar Walser, Monteiro, passa pela obra.» - Jean-Marc Lalanne; "Libération".
«Arrisquemos hipóteses. A provocação dadaísta, a imprecação epistolar, a estalada no gosto do público. A proximidade espiritual do cineasta e do escritor, sob o signo do humor melancólico, da tentação epicurista, da impossível procura pela beleza, e da loucura que ronda. O texto walseriano é admiravelmente dito em português.» - Jacques Mandelbaum; "Le Monde".
«Filme afrontosamente teórico e consagrado à perda da luz ou às incestuosas relações imagem/som, «Branca de Neve» é sobretudo um grande filme sensual, onde a ressurreição da heroína do conto as suas hesitações entre desaparecimento doloroso e esperança de retorno, perdão e ressentimento, não são tratados senão através da matéria fílmica.» - Frédéric Bonnaud; "Les Inrockuptibles".
«Uma obra prima de síntese e de provocação às últimas consequências. Assina-a, não por acaso, um génio do cinema contemporâneo como João César Monteiro. Há no trabalho de Monteiro muito do que é hoje em dia reflexão sobre o corpo cinema. Este filme é uma magnífica lição de cinema.» - Cristina Piccino; "Il Manifesto".
"Mais do que ver, gostaria de ouvir" - Robert Walser
Vídeo e imagem: Madragoa Filmes
Post já publicado no blog "O Bar do Ossian"